terça-feira, 9 de setembro de 2008

1A - CR 8279

CARTA ROGATÓRIA 8279

T r a n s c r i ç õ e s
Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.

Mercosul: Protocolo de Medidas Cautelares
Carta Rogatória nº 8.279-República Argentina
Ministro Celso de Mello (Presidente):
MERCOSUL. Protocolo de Medidas Cautelares (Ouro Preto/MG). Ato de direito internacional público.

Convenção ainda não incorporada ao direito interno brasileiro. Procedimento constitucional de incorporação dos atos internacionais que ainda não se concluiu. O Protocolo de Medidas Cautelares adotado pelo Conselho do Mercado Comum (MERCOSUL), por ocasião de sua VII Reunião, realizada em Ouro Preto/MG, em dezembro de 1994, embora aprovado pelo Congresso Nacional (Decreto Legislativo nº 192/95), não se acha formalmente incorporado ao sistema de direito positivo interno vigente no Brasil, pois, a despeito de já ratificado (instrumento de ratificação depositado em 18/3/97), ainda não foi promulgado, mediante decreto, pelo Presidente da República. Considerações doutrinárias e jurisprudenciais em torno da questão da executoriedade das convenções ou tratados internacionais no âmbito do direito interno brasileiro. Precedentes: RTJ 58/70, Rel. Min. OSWALDO TRIGUEIRO - ADI nº 1.480-DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO.

Trata-se de carta rogatória expedida pela Justiça da República da Argentina com a finalidade de
viabilizar a efetivação, em território brasileiro, de atos de caráter executório (fls. 6).

A douta Procuradoria-Geral da República, ao opinar pela concessão do exequatur, fundamentou-se na existência do Protocolo de Medidas Cautelares celebrado, no âmbito do MERCOSUL, pelos Governos da Argentina, do Brasil, do Paraguai e do Uruguai. Em seu parecer, o Ministério Público Federal enfatizou que “O objeto da carta encontra respaldo no Protocolo de Medidas Cautelares firmado entre Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai, que prevê a possibilidade de cumprimento de medidas cautelares destinadas a impedir a irreparabilidade de um dano em relação à pessoas, bens e obrigações de dar, e fazer e não fazer, desde que atendidos os requisitos do art. 21 da mesma Convenção, o que ocorre no presente caso” (fls. 52/53).

Não obstante as valiosas ponderações expendidas pela Procuradoria-Geral da República, entendo incabível a concessão de exequatur na espécie destes autos, eis que as diligências rogadas pela Justiça argentina revestem-se de nítido caráter executório.
Essa particular característica da medida judicial ora solicitada na presente carta rogatória basta, por si só, para inviabilizar a pretendida concessão de exequatur, no que concerne à efetivação dos atos de índole executória.

É que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, em tema de cartas rogatórias passivas, tem, invariavelmente, repelido a possibilidade jurídica de concessão do exequatur para efeito de realização, em território brasileiro, de diligências de natureza executória:
“Sempre se entendeu que as cartas rogatórias executórias são insuscetíveis de cumprimento
no Brasil. É preciso notar, porém, que o caráter executório de uma rogatória se há de aferir, não pela natureza da demanda que lhe dá origem, mas pela finalidade que a anima, traduzida na realização, no Brasil, de atos de constrição judicial inerentes à execução forçada.” (RTJ 72/659-667, 664, Rel. Min. OSWALDO TRIGUEIRO - trecho do voto do Min. XAVIER DE ALBUQUERQUE - grifei)

“(...) constitui princípio fundamental do direito brasileiro sobre rogatórias o de que nestas não se
pode pleitear medida executória de sentença estrangeira que não haja sido homologada pela Justiça do Brasil.”(RTJ 93/517, 519, Rel. Min. ANTONIO NEDER - grifei)

“A Carta Rogatória é a solicitação de autoridade judiciária estrangeira para autoridade judiciária
brasileira, ou vice-versa, tendo por objeto a realização de um ato processual relativo a um pleito. A carta pode ter por escopo a citação, intimação, notificação, inquirição, exames, etc...Na tradição do direito brasileiro, inspirada no princípio da cooperação judiciária internacional, sempre se acolheu a Carta Rogatória com a finalidade de citação ou inquirição. Isto já vem do Aviso nº 1, de 1º de outubro de 1847, contanto que fosse desprovida de caráter executivo (...)

...............................................................................

(...) Ora, a jurisprudência desta Corte é pacífica em conceder exequatur à Carta Rogatória de
intimação, porque ela não requer a prática de qualquer ato de execução.”
(RTJ 103/536, 541, Rel. p/ o acórdão Min. ALFREDO BUZAID - grifei)

Essa orientação jurisprudencial - reiterada em outros julgamentos do Supremo Tribunal Federal (CR 5.715 - CR 6.958) - encontra apoio em autorizado magistério doutrinário, que, na análise do tema, e na perspectiva do sistema jurídico brasileiro, adverte que as cartas rogatórias passivas não podem revestirse de eficácia executória (HERMES MARCELO HUCK, “Sentença Estrangeira e Lex Mercatoria”, p. 35/39, item n. 6, 1994, Saraiva; WILSON DE SOUZA CAMPOS BATALHA, “Tratado de Direito Internacional Privado”, vol. II/408-409, 2ª ed., 1977, RT; AMILCAR DE CASTRO, “Direito Internacional Privado”, p. 585-586, item n. 334, 4ª ed., 1987, Forense; AGUSTINHO FERNANDES DIAS DA SILVA, “Direito Processual Internacional”, p. 170, item n. 179, 1971, Rio de Janeiro; HAROLDO VALLADÃO, “Direito Internacional Privado”, vol. III/176, 1978, Freitas Bastos; OSCAR TENÓRIO, “Direito Internacional Privado”, vol II/370, item n. 1.216, 11ª ed., 1976, Freitas Bastos; MARIA HELENA DINIZ, “Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro Interpretada”, p. 304, item n. 6, 1994, Saraiva, v.g.).

Vê-se, portanto, que constitui característica fundamental do sistema normativo brasileiro a préexclusão de qualquer atividade de índole executória em tema de cartas rogatórias passivas (vale dizer, aquelas expedidas por Tribunais estrangeiros e dirigidas ao Supremo Tribunal Federal), pois, em tal hipótese, impor-se-á a necessária e prévia homologação da respectiva decisão estrangeira, a efetivar-se em procedimento específico a ser instaurado, no âmbito desta Corte, nos termos do CPC (arts. 483 e 484) e do RISTF (arts. 215 a 224).

Em regra, as cartas rogatórias encaminhadas à Justiça brasileira somente devem ter por objeto a
prática de simples ato de informação ou de comunicação processual, ausente, desse procedimento, qualquer conotação de índole executória, cabendo relembrar, por necessário, a plena admissibilidade, em tema de rogatórias passivas, da realização, no Brasil, de medidas cientificatórias em geral (intimação, notificação ou citação), consoante expressamente autorizado pelo magistério jurisprudencial prevalecente no âmbito desta Suprema Corte (RTJ 52/299 - RTJ 87/402 - RTJ 95/38 - RTJ 95/518 - RTJ 98/47 - RTJ 103/536 - RTJ 110/55).

Não constitui demasia enfatizar que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal orienta-se no
sentido de considerar insuscetíveis de cumprimento, no Brasil, as cartas rogatórias passivas revestidas de caráter executório, ressalvadas, unicamente, aquelas expedidas com fundamento em atos ou convenções internacionais de cooperação interjurisdicional (CR 7.899, Rel. Min. CELSO DE MELLO - CR 7.618 (AgRg), Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE - CR 7.914, Rel. Min CELSO DE MELLO - CR 8.168, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.).

No caso ora em análise, observo, como precedentemente já enfatizado, que as diligências
solicitadas pela Justiça rogante revestem-se de caráter executório. Sendo insuscetível de cumprimento, em nosso País, mediante simples procedimento rogatório, a diligência em questão, revela-se inviável, no caso, a concessão do pretendido exequatur.

Nem se alegue, para justificar a pretendida concessão de exequatur, que as diligências rogadas -
embora de caráter executório - encontrariam fundamento em convenção internacional consubstanciada no Protocolo de Medidas Cautelares aprovado pelo Conselho do Mercado Comum (MERCOSUL), por ocasião de sua VII Reunião, realizada em Ouro Preto/MG, nos dias 16 e 17 de dezembro de 1994. É que esse ato de direito internacional público, muito embora aprovado pelo Congresso Nacional (Decreto Legislativo nº 192/95), não se acha formalmente incorporado ao sistema de direito positivo interno vigente no Brasil, pois, a despeito de já ratificado (instrumento de ratificação depositado em 18/3/97), ainda não foi promulgado, mediante decreto, pelo Presidente da República.

Na realidade, o Protocolo de Medidas Cautelares (MERCOSUL) - que se qualifica como típica
Convenção Internacional - não se incorporou definitivamente à ordem jurídica doméstica do Estado brasileiro, eis que ainda não se concluiu o procedimento constitucional de sua recepção pelo sistema normativo brasileiro.

A questão da executoriedade dos tratados internacionais no âmbito do direito interno - analisado
esse tema na perspectiva do sistema constitucional brasileiro, tal como resultou debatido no julgamento da ADI nº 1.480-DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO - supõe a prévia incorporação desses atos de direito internacional público ao plano da ordem normativa doméstica.

Não obstante a controvérsia doutrinária em torno do monismo e do dualismo tenha sido qualificada por CHARLES ROUSSEAU (“Droit International Public Approfondi”, p. 3/16, 1958, Dalloz, Paris), no plano do direito internacional público, como mera “discussion d’école”, torna-se necessário reconhecer que o mecanismo de recepção, tal como disciplinado pela Carta Política brasileira, constitui a mais eloqüente atestação de que a norma internacional não dispõe, por autoridade própria, de exeqüibilidade e de operatividade imediatas no âmbito interno, pois, para tornar-se eficaz e aplicável na esfera doméstica do Estado brasileiro, depende, essencialmente, de um processo de integração normativa que se acha delineado, em seus aspectos básicos, na própria Constituição da República. Daí a precisa observação de JOÃO GRANDINO RODAS (“Tratados Internacionais”, p. 17, item n. 8, 1991, RT):

“É corolário da teoria dualista a necessidade de, através de alguma formalidade, transportar o
conteúdo normativo dos tratados para o Direito interno, para que estes, embora já existentes no plano internacional, possam ter validade e executoriedade no território nacional. Consoante o monismo, não será necessária a realização de qualquer ato pertinente ao Direito interno após a ratificação.

Grande parte dos Estados, seguindo a concepção dualista nesse pormenor, prescreve sejam os
tratados já ratificados incorporados à legislação interna através da promulgação ou simples publicação.” (grifei)

Não obstante tais considerações, impende destacar que o tema concernente à definição do
momento a partir do qual as normas internacionais tornam-se vinculantes no plano interno excede, em nosso sistema jurídico, à mera discussão acadêmica em torno dos princípios que regem o monismo e o dualismo, pois cabe à Constituição da República - e a esta, somente - disciplinar a questão pertinente à vigência doméstica dos tratados internacionais.

Sob tal perspectiva, o sistema constitucional brasileiro - que não exige a edição de lei para efeito de incorporação do ato internacional ao direito interno (visão dualista extremada) - satisfaz-se, para efeito de executoriedade doméstica dos tratados internacionais, com a adoção de iter procedimental que compreende a aprovação congressional e a promulgação executiva do texto convencional (visão dualista moderada).

Uma coisa, porém, é absolutamente inquestionável sob o nosso modelo constitucional: a ratificação

- que se qualifica como típico ato de direito internacional público - não basta, por si só, para promover a automática incorporação do tratado ao sistema de direito positivo interno. É que, para esse específico efeito, impõe-se a coalescência das vontades autônomas do Congresso Nacional e do Presidente da República, cujas deliberações individuais - embora necessárias - não se revelam suficientes para, isoladamente, gerarem a integração do texto convencional à ordem interna, tal como adverte JOSÉ FRANCISCO REZEK (“Direito Internacional Público”, p. 69, item n. 34, 5ª ed., 1995, Saraiva).

Desse modo, e para além da controvérsia doutrinária que antagoniza monistas e dualistas, impõe-se reconhecer que, em nosso sistema normativo, é na Constituição da República que se deve buscar a solução normativa para a questão da incorporação dos atos internacionais ao ordenamento doméstico brasileiro. Para esse efeito, a Lei Fundamental da República qualifica-se como a sedes materiae que se mostra essencial à identificação do procedimento estatal concernente à definição do momento a partir do qual as normas constantes de tratados internacionais passam a vigorar, com força executória, no plano do sistema jurídico nacional.

O exame da Carta Política promulgada em 1988 permite constatar que a execução dos tratados
internacionais e a sua incorporação à ordem jurídica interna decorrem, no sistema adotado pelo Brasil, de um ato subjetivamente complexo, resultante da conjugação de duas vontades homogêneas: a do Congresso Nacional, que resolve, definitivamente, mediante decreto legislativo, sobre tratados, acordos ou atos internacionais (CF, art. 49, I) e a do Presidente da República, que, além de poder celebrar esses atos de direito internacional (CF, art. 84, VIII), também dispõe - enquanto Chefe de Estado que é - da competência para promulgá-los mediante decreto.

A própria jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, ao analisar a questão pertinente à inserção dos atos internacionais no âmbito do direito positivo interno brasileiro, destacou - na perspectiva da disciplina constitucional que rege esse processo de recepção - que, “Aprovada essa Convenção pelo Congresso Nacional, e regularmente promulgada, suas normas têm aplicação imediata, inclusive naquilo em que modificarem a legislação interna” (RTJ 58/70, Rel. Min. OSWALDO TRIGUEIRO).

Esse entendimento jurisprudencial veio a ser confirmado e reiterado no julgamento da ADI nº 1.480- DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO, ocasião em que se enfatizou, uma vez mais, que o decreto presidencial, que sucede à aprovação congressual do ato internacional e à troca dos respectivos instrumentos de ratificação, revela-se - enquanto momento culminante do processo de incorporação desse ato internacional ao sistema jurídico doméstico - manifestação essencial e insuprimível, especialmente se considerados os três efeitos básicos que lhe são pertinentes: (a) a promulgação do tratado internacional; (b) a publicação oficial de seu texto; e (c) a executoriedade do ato internacional, que passa, então, e somente então, a vincular e a obrigar no plano do direito positivo interno.

Lapidar, sob essa perspectiva, a decisão proferida pelo E. Tribunal de Justiça do Estado do Rio
Grande do Sul, que, bem apreciando a questão da integração dos tratados internacionais ao nosso direito interno - e refletindo o próprio magistério da doutrina (MANOEL GONÇALVES FERREIRA FILHO, “Comentários à Constituição Brasileira de 1988”, vol. 2/21, 1992, Saraiva) -, acentuou:

"...No direito brasileiro, dá a Constituição Federal competência privativa ao Presidente da República para celebrar tratados e convenções internacionais ad referendum do Congresso Nacional (...). Por outro lado, tem o Congresso Nacional competência exclusiva para resolver definitivamente sobre tratados e convenções celebrados com os Estados estrangeiros pelo Presidente da República (...). Assim, celebrado o tratado ou convenção por representante do Poder Executivo, aprovado pelo Congresso Nacional e promulgado pelo Presidente da República, com a publicação do texto em português no órgão de imprensa oficial, tem-se como integrada a norma da convenção internacional no direito interno." (grifei) (Revista de Jurisprudência do TJRS, vol. 4/193, Rel. Des. PAULO BOECKEL VELLOSO)

O eminente Ministro FRANCISCO REZEK, hoje Juiz da Corte Internacional de Justiça, em Haia, ao discorrer sobre esse tema em valiosíssima obra monográfica ("Direito dos Tratados", p. 384/386, itens ns. 321 e 322, 1984, Forense), ressalta a imprescindibilidade da promulgação e da publicação, por ordem presidencial, dos tratados celebrados pelo Brasil (desde que já definitivamente aprovados pelo Congresso Nacional), sob pena de absoluta ineficácia jurídica desses atos internacionais no plano doméstico:

"O ordenamento jurídico, nesta república, é integralmente ostensivo. Tudo quanto o compõe - resulte de produção legislativa internacional ou doméstica - presume publicidade oficial e vestibular. Um tratado regularmente concluído depende dessa publicidade para integrar o acervo normativo nacional, habilitando-se ao cumprimento por particulares e governantes, e à garantia de vigência pelo Judiciário.
...............................................................................

No Brasil se promulgam, por decreto do Presidente da República, todos os tratados que tenham feito objeto de aprovação congressional.

..............................................................................

Cuida-se de um decreto, unicamente porque os atos do Chefe de Estado costumam ter esse nome.(...). Vale aquele como ato de publicidade da existência do tratado, norma jurídica de vigência atual ou iminente. Publica-os, pois, o órgão oficial, para que o tratado - cujo texto completo vai em anexo - se introduza na ordem legal, e opere desde o momento próprio." (grifei).

Vê-se, portanto, que a aprovação congressual e a promulgação executiva atuam, nessa condição,
como pressupostos indispensáveis da própria aplicabilidade, no plano normativo interno, da convenção internacional celebrada pelo Brasil (CELSO D. DE ALBUQUERQUE MELLO, "Curso de Direito Internacional Público", vol. 1/125, itens 89 e 90, 4ª ed., 1974, Freitas Bastos; HILBEBRANDO ACCIOLY, "Tratado de Direito Internacional Público", vol. I/577 e 601-603, itens 904 e 933-935, 2ª ed., 1956, RJ).

Torna-se irrecusável admitir, portanto, que o Protocolo de Medidas Cautelares celebrado no âmbito do MERCOSUL ainda não se acha formalmente incorporado ao sistema de direito positivo interno do Brasil, razão pela qual não pode ele ser invocado, no plano doméstico, como fundamento de concessão do exequatur, em tema de cartas rogatórias com efeito executório.

Cumpre assinalar, finalmente, que os atos internacionais, uma vez regularmente incorporados ao
direito interno, situam-se no mesmo plano de validade e eficácia das normas infraconstitucionais.

Essa visão do tema foi prestigiada em decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE nº 80.004-SE (RTJ 83/809, Rel. p/ o acórdão Min. CUNHA PEIXOTO), quando se consagrou, entre nós, a tese - até hoje prevalecente na jurisprudência da Corte (e recentemente reiterada no julgamento da ADI nº 1.480-DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO) - de que existe, entre tratados internacionais e leis internas brasileiras, de caráter ordinário, mera relação de paridade normativa.

A normatividade emergente dos tratados internacionais, dentro do sistema jurídico brasileiro, por isso mesmo, permite situar esses atos de direito internacional público, no que concerne à hierarquia das fontes, no mesmo plano e no mesmo grau de eficácia em que se posicionam as leis internas (JOSÉ ALFREDO BORGES, in Revista de Direito Tributário, vol. 27/28, p. 170-173; FRANCISCO CAMPOS, in RDA 47/452; ANTONIO ROBERTO SAMPAIO DORIA, "Da Lei Tributária no Tempo", p. 41, 1968; GERALDO ATALIBA, "Apontamentos de Ciência das Finanças, Direito Financeiro e Tributário", p. 110, 1969, RT; IRINEU STRENGER, "Curso de Direito Internacional Privado", p. 108/112, 1978, Forense; JOSÉ FRANCISCO REZEK, "Direito dos Tratados", p. 470/475, itens 393-395, 1984, Forense, v.g.).

A eventual precedência dos atos internacionais sobre as normas infraconstitucionais de direito
interno somente ocorrerá - presente o contexto de eventual situação de antinomia com o
ordenamento doméstico -, não em virtude de uma inexistente primazia hierárquica, mas, sempre, em face da aplicação do critério cronológico (lex posterior derogat priori) ou, quando cabível, do critério da especialidade (RTJ 70/333 - RTJ 100/1030 - RT 554/434).

De qualquer maneira, impõe-se aguardar, no caso ora em análise, a definitiva incorporação, ao
sistema de direito positivo interno brasileiro, do Protocolo de Medidas Cautelares aprovado no âmbito do MERCOSUL, sem o que esse ato de direito internacional público não poderá ser aplicado, no âmbito doméstico, pelas autoridades nacionais.

Assim sendo, e tendo em consideração as razões expostas, nego exequatur à presente carta
rogatória. Devolva-se, por via diplomática, a presente comissão rogatória, à Justiça rogante.
Publique-se.

Brasília, 04 de maio de 1998

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